O homem que lê

Na praça, entre as sombras das árvores que tentam esconder a crueldade do sol, lá estava ele. Um homem, vestes simples, olhar distante, mas segurando com reverência algo que parecia ser mais que um pedaço de papel. Entre os murmúrios das folhas, ele desdobrou aquele tesouro com carinho.

Não era Shakespeare, nem os rios de palavras do Machado de Assis. Não, tampouco um tratado de matemática ou filosofia. Poderia ser um livro de História do Brasil, ou do mundo. Talvez uma língua estrangeira, a Bíblia, a Torá, o Alcorão letras e sons que, para muitos, eram tão distantes quanto as estrelas do céu noturno. Que aflição, eu não sei o que lia o homem. Estou arrependido, não perguntei.

A cidade do Rio de Janeiro, meus caros, é uma dama de muitos mistérios. Ela exibe suas idiossincrasias com um orgulho cruel, misturando a beleza exuberante das praias aos becos escuros onde a esperança parece não ousar adentrar.

E ali, naquele pequeno espaço de verde, onde as injustiças sociais parecem repousar como fantasmas adormecidos, um homem sem teto desafiava o mundo. Ele segurava nas mãos a chave para um universo diferente, um portal que o transportava para além dos limites daquela praça.

Ninguém sabe de onde veio aquele livro, ou como ele chegou às mãos daquele homem. Provavelmente tenha sido um presente do destino, uma pequena fagulha de luz em meio à escuridão que o cercava.

Enquanto os passantes apressados seguiam seus rumos, o homem ali permanecia, imerso naquelas páginas fabulosas. E nesse momento, naquela praça que já viu tanto, um pequeno milagre acontecia. A esperança renascia, mesmo que por breves instantes, nas mãos daquele homem sem casa, mas com um tesouro nas mãos.

E assim, a cidade do Rio de Janeiro continuava a pulsar, entre a beleza indomável da natureza e as cicatrizes sociais que marcam sua história. Porque nesta cidade de contrastes, até mesmo os mais esquecidos têm o poder de surpreender e nos lembrar da resiliência humana, mesmo nos momentos mais inusitados.