O "homem-máquina", assim o negro era percebido no sistema de exploração escravista
Mesmo considerando a possibilidade de um retorno ao passado através do tráfico de escravos ou com a persistência do uso da mão de obra africana, o debate sobre a escravidão na imprensa era um meio de manter viva a discussão sobre uma possível colonização africana. É relevante ressaltar que o tráfico de escravos foi definitivamente proibido em 1850 através da Lei Eusébio de Queiroz. Entretanto, a venda de escravizados não parou, provocando consideravelmente o aumento do tráfico inter-provincial. Caio Prado Júnior, em sua análise, ressaltou o traço essencial das grandes lavouras: a exploração em larga escala. A utilização do braço africano ao longo dos anos foi uma prática arraigada na produção cafeeira do Brasil, incorporada ao sistema produtivo e econômico da época.
Um exemplo desse debate pode ser observado no Jornal do Commercio, em 1857, que abordou em um artigo diversas questões relacionadas à escravidão. O jornal não se furtou em analisar aspectos que iam desde o receio de reações por parte da Inglaterra até as políticas envolvidas no tema da escravidão. A perspectiva abordada pelo periódico revelava não apenas a preocupação com eventuais consequências externas, como também a complexidade das questões políticas e sociais que cercavam o sistema escravista. De acordo com o jornal:
[...] Uma vez admitida a colonização africana, é para nós fora de toda dúvida que quase totalidade dos nossos lavradores preferia os colonos da África aos colonos mais ou menos civilizados da culta Europa. A razão desta preferência lamentável está explicada pelos nossos hábitos: os lavradores brasileiros estão acostumados ao trabalho desses homens-máquinas, que se alimenta e se veste com menos dispêndio, e que enfim cava a terra sem se queixar do ardor do Sol, nem da violência da chuva, e nem mesmo da fadiga. Contar-se-ia que o colono africano em tudo e por tudo se mostrasse como o escravo, e, portanto, a preferência sobre o homem da Europa estava indubitavelmente decidida. Mas desde que a colonização africana fosse um fato legal, o governo havia de tomar medidas indispensáveis para garantir a liberdade e os direitos do colono, e por mais que se calcule com a selvatiqueza do Africano fora puerilidade acreditar que ele ficasse ignorando a sua condição de simples colono, de homem livre e não escravo. Admitido este princípio, que alias não se pode contestar, está admitindo também e reconhecido o grande perigo da colonização africana, que seria um presente fatal e horrível feito aos nossos lavradores. [...]
Nesse contexto, o negro era tratado como uma peça fundamental na engrenagem da produção, sendo explorado de maneira brutal e desumana. Sua força de trabalho era incessantemente utilizada para atender aos interesses econômicos dos grandes proprietários de terra e produtores de café. Essa visão de "homem-máquina" desconsiderava totalmente sua individualidade, direitos e até mesmo sua condição básica de ser humano.
A escravidão não se resumia apenas à exploração do trabalho, mas também englobava um sistema de opressão que permeava todos os aspectos da vida dos escravizados. Eram privados de liberdade, vivendo em condições degradantes, subjugados a castigos físicos e psicológicos, além de serem privados de acesso à educação e a qualquer possibilidade de ascensão social.
A desumanização do negro no contexto escravista é um capítulo sombrio da história do Brasil, marcado pela crueldade e injustiça. A visão de "homem-máquina" não apenas revela a barbárie do sistema escravista, mas também evidencia a necessidade urgente de reconhecer e reparar as profundas cicatrizes deixadas por essa página dolorosa da história do país.
Fonte: REIS, Alessandro Mendonça dos. Colonização africana sim, tráfico de escravos não: O debate sobre a colonização africana na província do Rio de Janeiro, 1854-1860.
Imagem: Escravos na colheita do café, 1882 por Marc Ferrez. IMS
Importante texto. O negro era um sem vida, sem identidade própria. Total Absurdo, triste, vergonhoso
ResponderExcluirObrigado por seu comentário! É uma página terrível da história brasileira.
Excluirque tristeza! ler sobre isso da um nó na garganta, mas obg por compartilhar conosco, para que nunca esqueçamos as barbaridades ocorridas e fiquemos atentos aos acontecimentos.
ResponderExcluirAgradeço muitíssimo por seu comentário!
Excluirque tristeza! ler sobre isso da um nó na garganta, mas obg por compartilhar conosco, para que nunca esqueçamos as barbaridades ocorridas e fiquemos atentos aos acontecimentos.
ResponderExcluirQue texto forte, triste mas forte nos fazendo relembrar a triste história vivida pelo negro, porém vemos o quanto avançamos ao longo dessa jornada cada vida.Hosana
ResponderExcluirÉ correto que avanços históricos ocorreram, entretanto, ainda não foram suficientes. Obrigado pelo comentário!
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