Impacto da miscigenação na evolução da população brasileira e na saúde: Artigo publicado na revista Science em maio/2025
O artigo "Admixture's impact on Brazilian population evolution and health" ("Impacto da miscigenação na evolução da população brasileira e na saúde") publicado na revista Science em 15 de maio/2025, apresenta os resultados do maior mapeamento genômico da população brasileira realizado até o momento, revelando insights profundos sobre a história demográfica, a diversidade étnica e as implicações para a saúde pública no Brasil. Aqui estão os principais pontos destacados:
1. Diversidade Genética Única: O estudo analisou 2.723 genomas completos de brasileiros, identificando mais de 8 milhões de variantes genéticas desconhecidas, muitas delas associadas a ancestrais africanos, indígenas e europeus. Essa mistura recente (últimos 500 anos) faz do Brasil um dos países com maior nível de miscigenação genética do mundo .
2. História Demográfica Revelada no DNA: Os dados genéticos confirmam padrões históricos assimétricos, como a predominância de linhagens europeias no cromossomo Y (71%) e de linhagens africanas (42%) e indígenas (35%) no DNA mitocondrial, refletindo violências coloniais e dinâmicas sociais desiguais. No norte do país, há maior ancestralidade africana, enquanto no sul predomina a europeia .
3. Saúde Pública e Doenças: Foram identificadas variantes genéticas potencialmente patogênicas em 450 genes ligados a doenças cardíacas e obesidade, e em 815 genes relacionados a doenças infecciosas (malária, tuberculose, etc.). Essas descobertas podem explicar disparidades na susceptibilidade a enfermidades e orientar políticas de saúde mais precisas .
4. Seleção Natural Recente: O estudo detectou processos de seleção natural acelerados, como variantes genéticas que aumentam a fertilidade ou a resposta imune, moldadas pela pressão de patógenos e pela adaptação ao ambiente brasileiro pós-colonização .
5. Sub-representação de Populações Indígenas: Apesar da riqueza genética, a ancestralidade indígena permanece minoritária (13%), refletindo o extermínio histórico dessas populações. Contudo, o estudo demonstra que parte dessa diversidade pode ser recuperada por meio da análise de populações miscigenadas .
Importância Social:
O artigo vai além da genética, oferecendo uma "biografia molecular" do Brasil que intersecta história, desigualdade e saúde. Ele expõe como processos coloniais — como a escravidão, o extermínio indígena e a migração europeia — deixaram marcas no DNA da população, influenciando desde padrões de doenças até estruturas familiares. Além disso, a pesquisa desafia narrativas tradicionais sobre identidade nacional, mostrando que a miscigenação não foi harmoniosa, mas marcada por violências e hierarquias. Por fim, ao destacar a sub-representação de grupos não europeus em bancos de dados globais, o estudo reforça a necessidade de incluir a diversidade brasileira em pesquisas médicas, garantindo que avanços genômicos beneficiem toda a população .
Compreender as desigualdades sociais é fundamental para analisar a dinâmica social, política e econômica do Brasil. Essas desigualdades influenciam desde o acesso a direitos básicos até a participação política e a estabilidade democrática. Reconhecer e abordar essas questões é essencial para promover uma sociedade mais justa e equitativa.
Conclusão:
O artigo enfatiza que as desigualdades sociais no Brasil são multifacetadas e enraizadas em processos históricos complexos. Superá-las requer uma abordagem abrangente, que inclua reformas estruturais, políticas públicas eficazes e o engajamento da sociedade civil. Somente através de esforços coordenados será possível construir um Brasil mais igualitário e inclusivo.
A seguir, alguns dados disponíveis no artigo:
● Impacto da miscigenação na evolução da população brasileira e na saúde
Resumo do editor:
Muitas características clinicamente relevantes, como o metabolismo de fármacos, são caracterizadas por algumas variantes genéticas com efeitos relativamente amplos. No entanto, pode ser difícil identificar tais variantes quando a variação genética de uma população não é bem compreendida. Nunes et al . geraram dados de sequência do genoma completo para 2.723 indivíduos saudáveis em todo o Brasil, uma população caracterizada por miscigenação recente e desigual entre indígenas americanos, europeus e africanos escravizados. Eles identificaram quase 9 milhões de variantes genéticas não relatadas anteriormente, incluindo algumas previstas para afetar negativamente a função proteica, e usaram esses dados para refinar as estimativas de tempo de miscigenação. Esses dados representam um passo importante para amenizar as disparidades na cobertura genômica entre as populações. —Corinne Simonti
Resumo Estruturado:
INTRODUÇÃO
O Brasil é um vasto país continental, lar da maior população da América Latina e ostenta a maior população miscigenada recente do mundo. O processo de colonização trouxe cerca de 5 milhões de europeus para o Brasil, juntamente com a migração forçada de pelo menos 5 milhões de africanos e a dizimação das populações indígenas, que antes incluíam mais de 10 milhões de pessoas que falavam mais de 1.000 línguas. Essa interação histórica distinta moldou um mosaico complexo de diversidade genética, ressaltando a importância de estudos genômicos detalhados. No entanto, semelhante a outras populações do Sul Global, a população brasileira permanece notavelmente sub-representada na pesquisa genômica, onde há uma escassez de estudos que investiguem os efeitos da miscigenação dessa população em sua evolução, diversidade e estado de saúde.
JUSTIFICATIVA
Para abordar essas lacunas, geramos 2.723 sequências de genoma completo de alta cobertura da população brasileira, abrangendo comunidades urbanas, rurais e ribeirinhas de todas as cinco regiões geográficas do Brasil. Este conjunto de dados reflete um grupo diverso de origens étnicas, incluindo afro-brasileiros e descendentes de povos indígenas, e fornece uma representação abrangente da diversidade genômica brasileira. Métodos avançados, como inferência de ancestralidade local e análises baseadas em haplótipos, nos permitiram caracterizar regiões genômicas específicas de ancestralidade em diferentes períodos de tempo e regiões geográficas, e detectar assinaturas de seleção natural. Nossa pesquisa destaca as implicações evolutivas e de saúde da miscigenação, com foco na dinâmica histórica e demográfica que moldou os genomas brasileiros. Nossos resultados contribuem para uma compreensão mais profunda de como haplótipos globais e padrões de miscigenação resultantes de uma história evolutiva complexa podem afetar a saúde de uma população miscigenada.
RESULTADOS
Identificamos > 8 milhões de variantes previamente desconhecidas, 36.637 das quais são supostamente deletérias, e elucidamos uma correlação positiva entre essas variantes deletérias e componentes de ancestralidade genética. Também mostramos que a população brasileira é uma tapeçaria de haplótipos globais moldados por acasalamento não aleatório, com o pico de miscigenação ocorrendo nos séculos XVIII e XIX. Eventos de miscigenação múltiplos ou contínuos entre fontes parentais indígenas americanas, africanas e europeias formaram as populações brasileiras. Esses processos se alinham com os principais eventos históricos que moldaram o estado brasileiro nos últimos cinco séculos. Também identificamos que, após um período prolongado de acasalamento com viés sexual nos séculos iniciais, um forte padrão de acasalamento seletivo emergiu mais recentemente na população brasileira, independentemente da região estudada. Esses padrões revelam tanto a dinâmica violenta da colonização europeia quanto as marcas duradouras desse processo na América do Sul contemporânea. Dentro da extensa diversidade encontrada no Brasil, regiões genômicas ancestrais específicas originárias de diferentes populações estão distribuídas de forma desigual entre as regiões brasileiras e os períodos históricos. Essa distribuição demonstra o impacto duradouro das centenas de etnias que chegaram ao país por meio de milhões de europeus e africanos em diferentes épocas, miscigenando-se com a população indígena original e substituindo-a. Além disso, nosso estudo identifica diversos genes candidatos que foram submetidos à seleção antes e depois do contato na população miscigenada brasileira. Esses genes estão principalmente associados a maiores taxas de fertilidade, resposta imunológica e características metabólicas distintas.
CONCLUSÃO
Nossos resultados ressaltam a influência perceptível de diferentes origens ancestrais na saúde e na composição genética de indivíduos mestiços brasileiros. Mostramos que essa paisagem genética tem suas raízes na história evolutiva das comunidades indígenas brasileiras e na intrincada interação demográfica decorrente da imigração histórica, tanto forçada quanto voluntária, para o Brasil.
Diversidade genômica brasileira:
Um estudo abrangente de 2.723 sequências de genoma completo de alta cobertura de diversas regiões brasileiras revela mais de 8 milhões de variantes de nucleotídeo único (SNVs) recém-identificadas, destacando a pronunciada diversidade genômica do Brasil, moldada pela seleção natural, acasalamento não aleatório e pulsos contínuos de mistura desde 1500. Essas descobertas ressaltam a influência das origens ancestrais na saúde e no perfil genético da população brasileira, enraizada na história indígena e em diversas ondas de imigração.
● A íntegra do artigo publicado na revista Science na edição de 15 de maio/2025 Vol. 388 , Edição 6748, contendo os dados completos, gráficos e autores está disponível através do link:
https://www.science.org/doi/10.1126/science.adl3564
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Muito obrigado, com apreço.
Excelente!
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